Sentado no banco do jardim
observo o mundo em meu redor
vejo homens, mulheres, crianças
vejo rostos
vejo alegria, tristeza, choro
um casal que se ama
ainda se ama...
vejo brincadeiras de crianças
vejo uma mais traquina
a ser repreendida
chora, grita, faz birra
a mãe desespera
mas austéra
diz que chegou a hora de partir
a criança chora
vejo jogos de adultos
jogos de sedução
palavras sussurradas
a ouvidos atentos
sorrisos abertos, brancos
vejo brilhos nos olhares
bocas que se beijam
ainda se beijam...
vejo jogos de reformados
cartas, dominó, xadrez
velhos e menos velhos
em redor de outros velhos
que jogam
cartas, dominó, xadrez
ás de trunfo!
carrão!
xeque-mate!
cada um com seu jogo
aptidão
vejo também solidão
vejo e observo um rosto
nossos olhares cruzam-se
recebo um sorriso
podre, mas sorriso
retribuo com um aceno de cabeça
gesto convidativo
vem, senta-te aqui!
vem falar um pouco!
hesitação
desconfiança
mas por fim... a cedência
- Chamo-me Emanuel, e você?
- O meu nome é Gente.
- Quem tem o nome de... Gente?
digo sorrindo
mas admirado com a resposta
- Toda a gente.
fico sem palavras, não compreendo
- Olha filho!
diz o homem, pouco mais velho que eu
chamado Gente
- Quando reclamam comigo
não me chamam António, Manuel ou João
dizem sempre
" Sai daqui pedaço de gente"
" Mas que gente esta!"
" Porque deixam esta gente andar aqui?"
compreendes agora?
fico calado
sem saber que dizer
o silêncio diz tudo
levanto-me
estendo-lhe a mão
- O meu nome é Emanuel, e o seu?
ele olha-me a mão
hesitante aperta-a
- O meu nome é gente. Pedro gente.
e ri
um riso podre... mas riso
Caro Emanuel,
Infelizmente o que mais vemos por aí é "gente" sem nome, sem "rosto", cada vez mais sombras no nosso caminho...
Abraço
Alex
De
manu a 28 de Dezembro de 2008 às 20:32
Amigo Alex!
A situação deste texto é real, aconteceu comigo há alguns anos, e não sei porquê, hoje lembrei-me do Pedro gente, que conheci no jardim Parque dos principes, em Lisboa. Sei por experiência própria o que é a exclusão social mas foi apartir desse dia que passei a ver com olhos de ver, todos os Pedros gente que infelizmente andam pelas ruas das nossas cidades. Forte abraço.
É sempre interessante perceber o que gira em torno do nosso viver.
Cadinho RoCo
De
manu a 28 de Dezembro de 2008 às 20:39
Seja bem vindo neste espaço de poesia amadora, amigo "afónico".
Espero que não leve a mal este pequeno trocadilho com o seu nick . É verdade o que diz. Quantos de nós já cruzámos nas ruas esses Pedros gente, e nem os vimos. Infelizmente essa condição de sem-abrigo é um fenómeno cada vez mais epidémico no mundo globalizado em que vivemos. Obrigado pela sua visita e comentário, que tentarei retribuir brevemente. Um abraço.
De
Gothicum a 28 de Dezembro de 2008 às 22:11
amigo essa foi de estalo...eheheh
De
manu a 28 de Dezembro de 2008 às 22:29
Amigo Filipe!
É verdade. A resposta que me foi dada ( este episódio aconteceu-me há alguns anos) foi uma das melhores liçóes que recebi em toda a minha vida. Aprender até morrer. E esses cantinhos espalhados pela blogosfera? Eu que tenho estes três no mesmo espaço já me vejo em papos de aranha para os manter activos e actualizados, nem quero imaginar como é ter de entrar em tantos servidores. Abraços.
De
Gothicum a 28 de Dezembro de 2008 às 22:38
Como estou numa altura mais Dark parei com o do sapo e dedico-me a este. Obrigado por apareceres. Abraços
De
manu a 28 de Dezembro de 2008 às 22:42
Sempre que o tempo me permitir lá estarei. Abraço.
Parabéns.
Que belo poema. Toca bem fundo.
Às vezes precisamos parar para ver o q realmente nos rodeia e nos espantarmos com isso.
Aqui tens uma obra-prima.
Beijos
Catarina
De
manu a 29 de Dezembro de 2008 às 21:13
Olá Catarina!
Bem-vinda sejas, amiga querida
como é bom ter-te aqui de novo
este texto foi uma coisa sentida
assim homenageio este povo
Beijo grande
Este é um belo retrato das exclusões sociais, Manu. Muito, muito verdadeiro e actual... infelizmente e por todos os motivos. Gostei especialmente dele. Os sem-abrigo são uma realidade gritante dos nossos dias e eu só espero não vir a engrossar-lhes as fileiras...
Abraço grande e boas entradas em 2009!
De
manu a 30 de Dezembro de 2008 às 18:48
Olá poetisa! Tenha fé, que tudo se há-de resolver pelo melhor. Se há uma coisa que sei sobre si é que tem amigos que se preocupam consigo e estão prontos a ajudar, eu incluído. Precisando... Abraço.
Origada, Manu. Fico muito grata, mas há coisas que tenho mesmo de enfrentar sozinha. Houve quem pedisse empréstimos por carros, obras, viagens, casas... eu fi-lo por mera sobrevivência física e agora é que vão ser elas! Há muita, muita gente em situação idêntica, tanto quanto sei e vou lendo em alguns blogs ou na homepage do Sapo. Não percebo muito de política e nada de economia, mas devia ter pensado melhor antes de fazer o que fiz, há mais de um ano. Não sou mais do que os milhares de portugueses que se deixaram cair na mesma armadilha.
Abraço grande.
De
manu a 31 de Dezembro de 2008 às 19:05
Olá poetisa! Tivesse a amiga roubado uns milhões valentes e agora estava a usufruir de uma passagem de ano mais tranquila. Abraço e bom 2009
Passou-me pela cabeça... eheheh... mas não tenho prática... só se for um assalto com "pistola de água". Aliás, quando começaram a pressionar eu perguntei logo:
- Mas querem que eu assalte um banco? Só se for assim...
Boas entradas, Manu. Já consegui resolver o assunto... bem.. resolver, não. Adiar por mais uns dias, sim. Já não é nada mau!
Abraço grande e boas entradas!
De
manu a 31 de Dezembro de 2008 às 20:41
Bom e feliz 2009.
quando é que eles se resolvem a pôr uma taça de champanhe para estas ocasiões?
Abraço
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